Empreendedor Social de 2015 explica o trabalho de formação, mobilização e participação política com as comunidades pela OSCIP Agenda Pública em mais de 180 municípios brasileiros

  Acompanhar, assessorar e criar processos de participação. Essas são algumas das tarefas nos projetos e programas da Agenda Pública. Fundada pelo cientista social Sérgio Andrade, a OSCIP (Organização da Sociedade Civil...

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Acompanhar, assessorar e criar processos de participação. Essas são algumas das tarefas nos projetos e programas da Agenda Pública. Fundada pelo cientista social Sérgio Andrade, a OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público) contribui há sete anos na implementação e identificação de políticas públicas de mais de 180 municípios, formação política, na qualificação de espaços de participação, governança e gestão.

Reconhecido pela 11ª edição do Prêmio Empreendedor Social, na categoria empreendedor social, Sérgio irá integrar a Rede Folha de Empreendedores Socioambientais e a Rede Schwab de Empreendedores Sociais, o que possibilitará a participação em eventos internacionais, como o Fórum Econômico da América Latina, além de receber cursos e capacitações.

A 11ª edição do Prêmio Empreendedor Social recebeu 140 inscrições. Foram avaliados e passaram no primeiro filtro nove projetos entre os 74 candidatos a Empreendedor Social do ano e seus entre os 66 concorrentes ao título de Empreendedor Social de Futuro em 2015. Entre os 15 semifinalistas, foram selecionados seis que chegaram à final em um processo de avaliação que consumiu 1.400 horas de trabalho de consultores e jornalistas. O Prêmio Empreendedor Social é realizado em mais de 60 países pela Fundação Schwab, organização irmã do Fórum Econômico Mundial. Para conhecer melhor o trabalho da OSCIP, a equipe do Setor3 conversou com Sérgio Andrade.

Portal Setor3- Como foi o início da criação da organização e opção pelo tema de atuação?

Sérgio Andrade– A Agenda Pública começou dentro da Universidade de São Paulo e isso contribuiu muito para a construção de uma organização da sociedade civil ter nascido a partir de experiências de profissionais, estudantes e pessoas conectadas com a área de gestão pública, ciências sociais e da educação.  Esse desenho foi o mais apropriado para a proposta política que vislumbrávamos em 2008. Isso ocorreu em um período em que a construção do cenário político marchava aceleradamente e de construção de políticas da área social, em especial na área urbana, de direitos humanos e ambientais. Esse conjunto de políticas se tornavam um processo de construção institucional brasileiro muito interessante e desafiador, porque nós começávamos o processo identitário nacional do Brasil e na Constituição de 1988. Nós vivemos em 30 anos o que os europeus demoraram décadas e décadas. O processo de construção do Estado brasileiro é muito estimulante e nós enxergávamos que o elo mais frágil é sem dúvida o município, que se vê desde 1988 as voltas com uma série de políticas públicas entregues aos cidadãos. Dessa forma, era necessário fortalecer os governos locais e esses foram os desafios que entendemos como necessários. Houve uma mudança sim. Nós tínhamos uma intimidade maior com a agenda social e de organização e planejamento. Gradativamente a organização foi se envolvendo com questões mais complexas, como: gestão financeira, tributária, desenvolvimento econômico e dos processos de desenvolvimento territorial. Então, a necessidade das demandas trouxe sofisticação dos projetos. O processo compreende gestão e participação desde o início, um modelo de governança democrática. Trabalhamos por um modelo com gestão a favor das políticas públicas, mas sem participação ficam apenas os processos de gestão tecnocráticos. Sem participação, você não consegue viabilizar demandas da cidadania. E dentro das demandas de governança democrática, fomos nos aprofundando o trabalho, houve um crescimento institucional.

Portal Setor3- Atualmente quais são os principais desafios de gestão dos municípios brasileiros? O que mudou?

SA– Hoje há um imperativo muito grande em relação aos recursos. Toda crise política e inicial suscita na área da arrecadação. Nós podemos considerar que o desafio não é somente nessa área, mas um desafio de produção de políticas públicas.  Na medida em que as políticas públicas se tornam complexas, surgem novas diretrizes, você precisa estabelecer novos marcos regulatórios, novas institucionalidades e tudo isso obriga os municípios a darem voltas e entregar essas políticas públicas, qualificação das pessoas e o desenvolvimento das instituições do local. Por exemplo, o município de Ouro Preto (MG), observamos uma dependência muito grande de projetos de grande porte, seja hidrelétrica, um porto, que representam uma pauta de arrecadação dos municípios. Inibi, de certa maneira, ou não é necessário que o município crie alternativas sobre o risco de entrar em colapso na medida de em que hajam uma desativação, um problema econômico desse empreendimento. Essa questão do desenvolvimento somado a questões de gestão e qualificação das pessoas são os maiores problemas atuais.

Portal Setor3- Como se dá a relação entre prefeituras e a Agenda Pública?

SA– Temos dois modelos de atuação. Sabemos das dificuldades que existem por parte das prefeituras em obter recursos e desenvolver projetos para que sejam parceiros, fora do município. Sempre viabilizamos para desenvolvermos projetos de desenvolvimento institucional e chegar a essas cidades e enviar contrapartidas. É um círculo virtuoso, porque na medida que você se compromete com recursos próprios, também há uma valorização daquele investimento que é trazido ao município, que é gerado e investido naquela cidade. Nós não fazemos consultoria. Nossa abordagem é de construção de capacidade. O que é isso? Quando um município tem um problema, seja de um plano, ou de um convênio, ou uma adequação de legislação, qualquer que seja o problema, se entregarmos produtos prontos, o município não consegue resolver esse problema no futuro, o que nós queremos é que tenha capacidade locais para resolver problemas do futuro. Apostamos na institucionalidade.  E questionamos: Existem instituições que lidarão com esse problema? As instituições realizam necessidades básicas que são esperadas nesse cenário? Ou seja, ela analisa um cenário, ela planeja, ela sabe implementar, ela sabe onde estão os recursos. E está preparada para fazer isso? Eu consigo prestar contar dos recursos que eu tenho? Essas são as questões e habilidades que procuramos desenvolver. É um processo de construção de institucionalidades e de capacidades. Diferente de uma consultoria, porque ela resolve um problema pontual. Em geral, uma característica da nossa ação é quando nós temos um trabalho de fortalecimento da sociedade civil: permanecer no território. Nós acreditamos que os laços de confiança estabelecidos nos municípios são muito maiores que os resultados, quando estamos presentes. Nós amassamos o barro ali do local, vivenciamos os problemas, bebemos a mesma água. Nós procuramos ser também cidadãos que partilham daqueles problemas, características dos problemas de características institucionais daquela região. Embora a Agenda tenha uma atuação diversificada, não tem projetos com presença somente territorial.

Portal Setor3- Hoje quais são os principais programas e projetos da Agenda Pública?

SA– Temos dois principais programas: Escola de Políticas Públicas e Fortalecimento Institucional de Municípios Impactados por Grandes Empreendimentos. A Escola trabalha com soluções educacionais a governos. A experiência nos mostrou que os gestores públicos precisam de um processo pedagógico diferente, são adultos e possuem suas experiências e que precisam de algo muito conectado com a rotina da gestão da administração pública para que eles possam construir conhecimentos. Para isso mobilizamos não somente cursos presenciais no sentido tradicional, mas a distância, também trabalhamos com soluções de mentoria, com intercâmbio, formações rápidas e com várias soluções educacionais. Elas são amarradas em torno de um conceito chamado educação e movimento. Trata-se de uma proposta em que toda atividade educativa realizada por nós e nossa preocupação é que haja um processo de mudança dentro daquele órgão. Procuro deflagrar algum tipo de mudança, ou avaliação de processo, ou um diagnóstico. Sempre tenho um de para, próximos passos, alguma amarração dentro da administração. Essa é uma proposta pedagógica, que transformou a Escola de Políticas Públicas no último ano e está se transformando numa instituição independente da Agenda Pública. De fato, ela se tornou mais complexa. Tivemos há mais de cinco mil alunos desde 2010 e atuamos em mais de 180 municípios, porque atendemos por demanda e projetos especiais de parceiros, como CJU, Petrobras, Prefeitura de Cubatão e outros. Com presença territorial, estamos em seis Estados: Tocantins, Pará, São Paulo, Goiás e Distrito Federal. Também oferecemos cursos semipresenciais, ou a distância, ou presenciais, a capilaridade é bem grande. Do ano passado para cá, foram 2.400. Este ano também tivemos a proposta inovadora de valorizar mais as pessoas que trabalhavam conosco, que foram: ampliação do período de férias (40 dias), oferta de cursos e uma política de cargos e salários definidos. Isso tudo está em nosso planejamento para 2019. Na Escola de Políticas Públicas, temos apostado na reformulação do conselho de administração e conta com a participação de pessoas como Eduardo Mata, vice-presidente do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrape); Caio Magri, diretor do Instituto Ethos; Silmara Vieira, diretora do Departamento de Cidadania e Responsabilidade Socioambiental do Ministério do Meio Ambiente, entre outras pessoas importantes na área. A Escola já tem um planejamento independente.

Portal Setor3 – Quem viabiliza financeiramente os projetos e programas? É por convênio com prefeituras?

SA– Hoje os recursos estão mais atrelados a projetos de longo prazo. Eles duram de três a quatro anos. No Pará, trabalhamos com uma iniciativa chamada Territórios Sustentáveis, por exemplo. Trabalhar a longo prazo nos dá uma previsibilidade de parcerias de muita qualidade e zelamos com parcerias que não sejam tão pontuais, porque assim dá condições de fortalecimento institucional, que demandam mais tempo.

Portal Setor3- Poderia citar um exemplo de atuação de um desses programas de impacto na comunidade?

SA– Acho que uma experiência bem interessante foi o trabalho que fizemos na Baixa Santista para fortalecimento de políticas de juventude. Isso começou em 2010. Trata-se de uma parceria a longo prazo e já passamos por duas gestões e hoje temos uma relação muito próxima com os gestores da região. Começamos a discutir um problema muito sério: o desemprego na juventude. Nós tínhamos um programa chamado Juventude e Trabalho. Cerca de 270 vagas lá detectadas e no cadastro do centro de empregos tínhamos 16 mil pessoas na fila com perfil do projeto. Sabemos que essa não é somente uma fase da vida do jovem em que ele trabalha. Ele experimenta em várias dimensões e até suas relações com a família, com os amigos. Nós sabemos que a parte da dificuldade dos jovens em situação de vulnerabilidade. Não está somente a relação escolar, como aparentemente está e se divulga. Porém é necessário possuírem capital cultural e social para cultivarem e mostrarem que estão prontos para a vida. O Programa de Mentoria, da Agenda Pública, desenvolvido com as prefeituras, procurou trabalhar com os jovens a partir dessa perspectiva que são profissionais mais experientes e que orientaram meninos e meninas que falavam do programa. Na técnica, nos propusemos a pensar como o jovem numa organização numa instituição fechada como é a Fundação Casa pensa na integração. Esse foi um dos projetos mais bem sucedidos. Nós conseguimos a partir desse projeto ficarmos quatro anos com a Petrobras a partir deste projeto, levar para a Fundação Casa e agora estamos na fase final para levar para a Fundação Casa em três municípios da Baixada Santista. Este é o nosso projeto mais bem sucedido e você vê claramente o beneficiado na ponta e o resultado de política pública. Nosso trabalho é pensar como aquilo que uma organização da sociedade civil pode gerar resultados que podem não só ser adotados pelo governo, mas construídos com o governo para que possam inspirar políticas públicas. Nós construímos várias publicações e dois cursos com a Secretaria Nacional da Juventude.

Portal Setor3 – Após as mobilizações de junho de 2013, como vocês observam essa participação popular nas políticas públicas?

SA- Estamos aprendendo a olhar para a participação institucionalizada de outra maneira. A Agenda Pública sempre teve um olhar muito atento para questão institucional. Nós trabalhamos para o fortalecimento das instâncias de participação, mas elas são um complemento das instâncias representativas. Hoje em dia temos que olhar para a participação social de diversas maneiras, não só a participação formal e institucionalizada que basta para termos satisfação qualificada. Nós acreditamos na qualificação dos ambientes de participação. Então, de que adianta ter conselho com muita gente que elegeu, mas que não tem fórum, não tem uma representatividade e não dialoga com a sociedade. A representatividade que vai ao conselho ela não tem pluralidade que é construída. Dou um exemplo: nós trabalhamos numa perspectiva com a construção de associações de moradores e temáticas (associação de idosos, de deficientes, entre outros). Todas essas institucionalidades que você vai criando, elos construindo envolvimento das pessoas com as políticas. Nós precisamos pensar em novas maneiras de apresentar a política ao cidadão. Ele precisa ser apresentado a política de uma forma nobre. Ela transformou esse país nos últimos 25 anos, entregou outro país com as opções políticas que fizemos, por mais o momento fica muito desfavorável, conseguimos construir um país do qual podemos nos orgulhar. Nós combatemos brutalmente a desigualdade, fizemos uma economia dinâmica, que passa por problemas, mas lutamos contra déficits habitacionais. Os indicadores nos autorizam reconhecer e temos que reconhecer que a política pode transformar a vida das pessoas para melhor. Como eu posso melhorar o meu bairro? Como uma pessoa da família que tem deficiência? Se eu vivo uma união homoafetiva, se você não trabalha isso de forma política e estabelece conexão com aquilo com a vida das pessoas, de fato nem o jovem, nem a Dona Maria que vive como dona de casa não vai reconhecer isso como algo para a vida dela. Essas conexões que procuramos fazer, usando cultura, gameficação, usando formas de trabalhar a participação.

Portal Setor3 – Você vê o envolvimento maior do jovem nessa discussão?

SA– Acho que a jovem está trilhando formas novas de participar, mas me preocupa essa polarização em que ele é apresentado e pode produzir uma geração muito intolerante. Temos um desafio: como trabalhar com o jovem para que ele se reconheça na política, aquela que reconhece ideias e respeita visões? Como trabalhamos com esse jovem que aceite o espírito democrático e não essa forma intolerante que se apresenta hoje? Pode ter um resultado muito complicado para o futuro. Então, acho que o jovem está encontrando outras maneiras de participar e nós vemos isso até na situação das escolas de São Paulo. Nas questões climáticas, você olha para isso e vê organizações, como Engajamundo, que trabalha para manifestações culturais, movimentos a favor da Paulista aberta em prol da ocupação de espaços públicos. Há outras formas de participação diferentes daquelas institucionalizadas e  com caráter burocratizante, que é antagônico a própria visão de mundo desse público, que temos que dialogar com essas percepções e com o desenvolvimento do jovem com a política.

Portal Setor3- Qual a relação da Agenda Pública com a plataforma das ODS? E os próximos desafios?

SA – Somos a secretaria executiva da plataforma da ODS. Ela é formada por organizações da sociedade civil privadas, dos governos, que representam governos locais, como Abong, Abrinq, Fundação Avina, Instituto Ethos, Gife, entre outros. Os aprendizados dos projetos e dos programas nos permitiram problematizar mais um pouco e propor uma forma de construção de multiatores que pudessem apoiar a implementação da nova agenda dos ODS de fato a levar ações concretas, além do alinhamento. Então, não é a empresa que tem a ação da educação, que é o objetivo 2, ela só vai encaixar e o município da mesma forma também. Ele pega o que está fazendo e coloca dentro do guarda-chuva. Precisamos realizar com ODS que vai além do alinhamento para medir o esforço que tem que fazer para atingir as metas. Uma preocupação das ODS é que o desafio é muito maior. Precisamos de uma aliança para problematizar essas questões. Dessa forma, temos que ficar atento com os indicadores e as metas. Tudo isso será definido pela ONU. Com a definição oficial, cada país começará a realizar sua agenda de indicadores locais e juntamente com as eleições quando os gestores serão apresentados com para essa agenda. Nos próximos dois anos temos necessidades de arranjos de implementação: como o governo federal irá trabalhar com os governos municiais? Como os governos municipais irão trabalhar com os estaduais? Qual o papel do poder privado e da sociedade civil? Tudo isso precisa ser preparado, formar as pessoas. Então, esse processo está muito antes do investimento direto. Onde nós não temos ações? Por exemplo, pensar na área de mudanças climáticas, será que os Estados possuem políticas próprias? Os governos estaduais muitos deles não têm e precisam desenvolver seu inventário de políticas e quais são as áreas mais sensíveis? Onde estão as políticas? Qual montante de recursos é necessário? Temos muito esforço para arranjos de implementação para produzir uma condução para implementação dessa agenda. Há necessidade de trabalhar nisso sem que tenhamos que dispender de grandes recursos para os próximos anos.

     Serviço:

Conheça aqui a trajetória de Sérgio Andrade: http://goo.gl/a4oCky

Site da Agenda Pública: http://agendapublica.org.br/