O Objetivo de Desenvolvimento Sustentável sobre o qual vou tratar nesta coluna está incomodamente presente na vida de todos os brasileiros: Paz e Justiça. Em seu enunciado o desafio proposto pelo ODS nº 16 está descrito como: “promover sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos, e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”. O que eu gostaria de analisar, leitor, são as contradições do nosso País, que, de um lado, figura dentre as maiores economias do mundo e, de outro, amarga índices de violência piores do que muitos países em guerra.
De acordo com o Banco Mundial, o Brasil está em 9º lugar no ranking dos maiores PIBs do mundo, como mostra a figura abaixo:
Mas qual seria a posição do Brasil em relação a esses mesmos países, se o ranking fosse do ODS nº 16? Tomemos a meta 16.1: “reduzir significativamente todas as formas de violência e as taxas de mortalidade relacionada, em todos os lugares”. Dentre os seus indicadores, há um relacionado ao número de homicídios e sua taxa por 100 mil habitantes.
Para fazer a tabela abaixo, utilizei dados de 2014 do Observatório de Homicídios, mantido pelo Instituto Igarapé:
Agora, leitor, vou criar uma terceira tabela, a partir do cruzamento de dados de 2016 sobre os países mais violentos do mundo, publicados pelo Observatório de Homicídios, com dados de PIB do Banco Mundial:
Observe, leitor, que a taxa de 29,4 homicídios/100 mil habitantes do Brasil (vide tabela 2) é praticamente igual à da África do Sul, de 30 homicídios/100 mil habitantes. Repare, ainda, que nessa tabela, à exceção de África do Sul e Venezuela, todos os demais países estão entre a 100ª e 184ª posição no ranking dos PIBs. Não é de se perguntar, leitor, o porquê da violência do Brasil estar no mesmo patamar de países tão pobres?
Em artigo intitulado “A naturalização da desigualdade”, publicado em 30/09 na Folha de S. Paulo, Oscar Vilhena Vieira, diretor da Escola de Direito de São Paulo da FGV, nos lembra que “a desigualdade não é um acidente na história de uma sociedade, mas sim fruto de deliberadas escolhas políticas e institucionais que favorecem a concentração de renda, bens e benefícios públicos”. O Brasil, leitor, quero insistir neste ponto, é a nona maior economia do mundo; não somos um país subdesenvolvido e não podemos mais achar normal conviver com o atual estado de coisas.
No caso de Pernambuco, onde é publicada esta Folha, a situação é ainda mais alarmante: aqui já chegamos à escandalosa média de 16 homicídios por dia, 37,8% a mais que no mesmo período do ano passado. Com isso, a taxa de homicídios por 100 mil habitantes no estado foi catapultada para 57, praticamente o mesmo patamar da Venezuela.
Para fins de comparação, compilei na tabela abaixo dados de 2014 que extraí da Wikipédia com o número de mortes em guerras que estão atualmente em curso.
A triste constatação que fazemos ao ler essa tabela é que, em 2014, o Brasil, mesmo não estando oficialmente em guerra civil, ocuparia o segundo lugar no ranking das guerras mais sangrentas do mundo, com maior número de mortos (59.681, vide tabela 2), atrás apenas da guerra da Síria. É a pré-falência do Estado brasileiro.
No Índice de Estados Frágeis (Fragile States Index) publicado em 2017 pelo Fundo para a Paz (Fund for Peace) o Brasil se encontra na 68ª posição, estando inserido na categoria “em risco”, como pode ser verificado no Mapa de Vulnerabilidade Estatal abaixo:
Situações excepcionais, leitor, exigem medidas excepcionais — jamais de exceção.
É tempo de tornarmos excepcional a nossa Democracia. De fazermos uma excepcional e intransigente defesa do Estado de Direito e de garantir igualdade de acesso à Justiça para todos.
Nada é mais poderoso do que uma ideia cujo tempo chegou. E o tempo é hoje.
Renato Raposo escreve semanalmente para o Portal FolhaPE. Ele é consultor de comunicação e atua com foco em transparência e responsabilidade social corporativa, tendo realizado projetos para organizações como Alfasol, Anbima, Bradesco, Cofra, Eletrobras, Grupo Libra, Odebrecht Panamá, SOS Mata Atlântica e União da Indústria de Cana‐de‐Açúcar, entre outras. Como executivo, ocupou posições de liderança na comunicação corporativa do Instituto Ethos, da Natura Cosmético e do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (C.E.S.A.R). Atualmente, é aluno do Mestrado Profissional em Gestão para a Competitividade com ênfase em Sustentabilidade do Centro de Estudos em Sustentabilidade (GVces) da Escola de Administração de Empresas da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP). É membro do Programa de Empreendedores Cívicos da Rede de Ação Política pela Sustentabilidade (RAPS); da Gold Community da Global Reporting Initiative (GRI); e da Comissão Brasileira de Acompanhamento do Relato Integrado (IIRC).
Fonte: Folha de Pernambuco